5 de julho de 2009

Por: Iomar Travaglinitravaglin@yahoo.com.br

Paisagismo, decoração, jardins e filosofia permeiam o filme O beijo da serpente

Philippe Rousselot ficou famoso como diretor de fotografia em clássicos como o filme francês O Urso, e nos filmes norte americanos Ligações perigosas e Nada é para sempre. Sendo que pelo último conquistou o Oscar. No entanto, a estréia de Rousselot no cinema, como diretor, no filme O Beijo da serpente não foi bem recebido pela crítica.
Reprodução de pôster do filme O beijo da serpente.


O enredo havia sido utilizado anteriormente pelo diretor inglês Peter Greenaway no belíssimo The draughtsman's contract, (1982) em um estilo por demais marcante para comparações. Basta verificar seus filmes O cozinheiro o ladrão, sua mulher e o amante (1989), e O livro de cabeceira (1996) cujas narrativas são minuciosas e efeitos digitais com alta definição.


Reprodução de pôster do filme The draughtsman's contract.

Neste filme o diretor apresenta a historia de um arquiteto sedutor que chega a uma casa senhorial para satisfazer o desejo do proprietário na construção de um jardim em honra a sua esposa e obter status junto à corte. Entre suas conquistas, o arquiteto encontra a filha do casal com uma relação muito especial junto à flora nativa do lugar num conflito da natureza contra a sua razão cosmopolita.


Castelo de Vaux-le-Vicomte

Greta Scacchi como a mulher insatisfeita tem excelente desempenho dividida entre o respeito ao marido e amor devotado ao arquiteto.

A filosofia e a ciência reinventando o espaço
O espaço denominado como jardim composto com nostalgia estética ou religiosa, flui como um registro histórico da passagem do homem e suas correntes de pensamento. No oriente, o homem dispôs de maneira diferente a visão ou arrumação do seu espaço ao redor da moradia. Nas pinturas murais do antigo Egito, nota-se que o espaço estava associado à água e à fartura proveniente das inundações do Nilo. Seguindo este exemplo, a cultura Mesopotâmica, grega, romana e finalmente turca, associaram a importância da água à concepção da vida e circundaram seu espaço paisagístico com tanques e pequenos rios.
Os espaços posteriores são divididos no ser e estar. O jardim oriental é o local de meditação (ser) e o ocidental, do permanecer (estar), um espaço de teatralização, lazer e, em alguns casos, de poder.

Grandes mudanças começaram a acontecer quando o astrônomo polonês Nicolau Copérnico (1473-1543), considerado o fundador da astronomia moderna, lançou a teoria, posteriormente comprovada, de que o sol, e não a terra, era o centro do nosso sistema solar. Essa teoria revolucionou o pensamento social e filosófico da época e, a partir desse momento, começou-se a acreditar que a tradição e a autoridade imposta pela Igreja era um estorvo, provocando o final da Idade Média e início da Idade Moderna na idéia de um pensamento mais racional.

As regras que Copérnico e seus seguidores, Tycho Brahe (1546-1601), Johannes Kepler (1571-1630), Galileu Galilei (1564-1642) e Isaac Newton (1642-1727), fizeram por aperfeiçoar equipamentos na área da física, facilitando medições astronômicas e terrestres apresentando uma visão mais controlada e simétrica do mundo que em certo momento foram refletidos nos "jardins da moda”. Nesta época os exemplos de jardins mais famosos e imitados são os de Versailles e do castelo de Vaux-le-Vicomte , criados pelo arquiteto francês André La Notre (1613-1700). Em seus jardins associava a simetria e o domínio do homem sobre a natureza, inclusive, poderes econômicos e políticos de seus proprietários.

O espaço do jardim reproduzido na tapeçaria
Os tapetes de origem Persa refletem na tradição religiosa na ideologia do jardim do Éden, ou o paraíso terreno. Sua reprodução significava a imagem do ideal e, na maioria das vezes, compunha a relação, já perdida, do contato com o divino. São muitos os significados do tapete como objeto de uso religioso, e era comum a representação da água, ligada à vida, como as plantas e flores.

Motivos florais, principalmente as rosas, representavam as estrelas e o firmamento. Segundo o Alcorão, a representação da imagem humana era proibida e a lembrança do divino era expressa pela natureza idealizada em um espaço perfeito, no caso, o jardim do Éden ou paraíso.

A utilização do tapete é também, neste contexto e em épocas anteriores, o recordar dos dias ensolarados e coloridos dos jardins nos rigorosos invernos. Eles eram trazidos para dentro das residências reais para adornar tanto os pisos quanto as paredes. Hoje, em termos decorativos, os tapetes são peças fundamentais que possuem uma conotação mais prática do ponto de vista do conforto e da composição de ambientes.

O Brasil e o espaço paisagístico
Os registros históricos do paisagismo brasileiro remontam, principalmente, à época da colonização, mas sem um estilo definido em termos de composição de espaços. Sabe-se que as casas possuíam um espaço onde eram plantadas árvores frutíferas e também serviam de abrigo para animais domésticos. As influências foram diversificadas devido às etnias provenientes. No caso dos palácios a cultura prezava a natureza real da imagem européia e suas origens dinásticas.
Imagem da propriedade de Veridiana da Silva Prado em Higienópolis.
Em meados do século 19 com a riqueza do café trouxe houve profundas mudanças, que possuem nos palacetes uma interessante fonte de estudos. As inovações não foram só internas nessas dependências da elite prevalecendo a França como referencia. Em seus interiores existe a idéia estética e nos exteriores o recreio, eliminando a função do antigo quintal, com seus pomares, e os criadouros de animais para consumo doméstico. A Vila Maria de propriedade de Veridiana da Silva Prado, cuja família produziu diversos membros políticos ligados a administração de São Paulo possui um exemplo do jardim da elite com lagos e fontes. A gestão dos Prado, inclusive, trouxeram mudanças no espaço urbano na criação de praças, ruas e paisagismo da cidade.

O criador dos primeiros viveiros municipais foi Antonio Andréa Etzel, pioneiro numa atividade que consistia em cultivar mudas nativas para jardinagem. Neste setor, foi o do pintor e paisagista Burle Marx (1909-1994) que se tornou o grande expoente na valorização de nossa flora com projetos importantes em praticamente todo o Brasil.

Retrato de Burle Marx (1940)
realizado pelo pintor Alberto da Veiga Guignard.

Livros e filmes sobre o assunto:
MAGEE, Bryan. Historia da filosofia. São Paulo: Loyola, 1999.
DOURADO, Guilherme Mazza. Jardim do solar. São Paulo: MCB, 2006. (Catálogo de exposição).
BARRA, Eduardo. Paisagens úteis. Escritos sobre paisagismo. São Paulo: Editora SENAC/Mandarim, 2006.
JELLICOE, Goffrey; JELLICOE, Susan. El paisaje del hombre: la conformación del entorno desde la pré historia hasta nuestros dias. Barcelona: Gustavo Gilli, 1995.


O BEIJO DA SERPENTE/THE SERPENT'S KISSNacionalidade: França/Alemanha/Grã Bretanha
Diretor: Philippe Rousselot
Atores: Ewan McGregor, Greta Scacchi, Pete Postlethwaite, Richard E. Grant
Roteiro: Tim Rose Price
Fotografía: Jean-François Robin
Música: Goran Bregovic
Gênero: Drama

THE DRAUGHTSMAN’S CONTRACT
Direção: Peter Greenaway
Nacionalidade: Inglaterra
Atores: Anthony Higgins, Janet Suzman, Anne Louise Lambert, Hugh Fraser, Suzanne Crowley, Neil Cunningham.
Gênero: Drama

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